sábado, 26 de julho de 2008

O motorista de Ben Laden Salim Hamdan


Salim Hamdan tornou-se no primeiro detido a ser julgado por crimes de guerra dos Estados Unidos desde a II Guerra Mundial
Salim Hamdan entrou para a história ao tornar-se no primeiro prisioneiro julgado por um tribunal de crimes de guerra americano desde a Segunda Guerra Mundial. Enfrentando as acusações de conspiração e de apoio material ao terrorismo, declarou-se inocente, na segunda-feira, quando foi presente ao tribunal militar de excepção instalado em Guantánamo, a base militar dos EUA em Cuba, para onde foi levada a maioria dos prisioneiros da guerra ao terrorismo desencadeada após o 11 de Setembro de 2001. 
Hamdan apresentou-se com ar desvairado, relataram os jornalistas, dificuldade no andar, envergando túnica creme, turbante branco e auscultadores de tradução na cabeça. Iemenita de origem, foi preso há quase sete anos, no Afeganistão, onde trabalhara tanto como motorista como guarda-costas de Ussama ben Laden. Apenas porque precisava dos 200 dólares que recebia, diz ele, tentando contrariar os que o acusam de ter ajudado o líder da Al-Qaeda a escapar às forças da coligação e de ter distribuído armas pelos que queriam resistir e apoiar o regime talibã. Os seus advogados afirmam que foi torturado, que é um mero actor secundário, mas não conseguiram impedir o julgamento deste combatente inimigo dos Estados Unidos. 
Natural de Hadramout, no Iémen, Hamdan terá nascido na década de 70, tendo levado uma vida modesta trabalhando como motorista de táxi, disse à AFP Jonathan Mahler, o autor de um livro que conta a sua história e vai ser publicado em Agosto. Quando foi recrutado para a Jihad, que muitos traduzem por guerra santa, tinha 26 anos. Estava- -se no ano de 1996 e Hamdan, que não era particularmente religioso, decidiu juntar-se a um grupo de 35 muçulmanos e partir para o Tajiquistão. Ali os militantes islamitas combatiam, na altura, o Governo apoiado pela Rússia. Os combatentes viram-se, no entanto, retidos no Afeganistão, após seis meses de caminhada pelas montanhas. Foi então que travaram conhecimento com Ussama ben Laden. O líder da Al-Qaeda, cujo pai era natural do Iémen, gostava de se rodear de gente da sua terra. Hamdan, dizem os procuradores, começou por trabalhar para ele na quinta Hada, próxima da cidade de Jalalabad e, mais tarde, em Kandahar, no Sul do Afeganistão. Foi depois promovido a seu motorista e guarda-costas. "Em diversas ocasiões, entre 1996 e 2001, conduziu e acompanhou Ben Laden a campos de treino para terroristas [como o Al-Faruq] e a conferências de imprensa ou reuniões", lê-se no auto de acusação, segundo o qual o detido recebeu formação em armas e forneceu armamento a apoiantes da Al-Qaeda. 
Após os atentados do 11 de Setembro, nos EUA, o iemenita conduziu Ben Laden num périplo por várias casas seguras enquanto as forças norte-americanas e aliadas tentavam localizá-lo. A separação, entre Hamdan e o líder da Al--Qaeda, deu-se em Outubro de 2001, quando ele levou a filha e a mulher grávida de Kandahar para a fronteira com o Paquistão. No caminho de regresso, foi parado por forças aliadas afegãs, que o entregaram aos EUA. Na altura transportava, alegadamente, dois mísseis terra-ar no carro em que seguia. Esteve seis meses nos campos de detenção norte- -americanos em Bagram e Kandahar. 
O antigo motorista de Ben Laden chegou a Guantánamo em Maio de 2002. Inicialmente foi levado para o campo número quatro, o dos prisioneiros com farda branca, mas posteriormente foi transferido para o sistema de isolamento em vigor no campo cinco. Os seus advogados iniciaram, então, uma odisseia legal que colocou à prova a política de detenções da guerra ao terrorismo da Administração de George W. Bush. O Supremo Tribunal dos EUA invalidou os tribunais militares de excepção, em 2006, mas o Congresso, controlado pelos republicanos, autorizou o sistema. Os membros da Al-Qaeda não foram classificados como presos de guerra, por causa das Convenções de Genebra, mas como combatentes inimigos dos EUA. 
Nas audiências preliminares, Hamdan expressou a sua frustração em relação ao tratamento recebido em Guantánamo e até mesmo em relação aos seus advogados. "Estar na solitária é como estar num cemitério. É como colocar uma pessoa morta num túmulo". No início do seu julgamento, o juiz militar, o capitão Allred, recusou as provas obtidas "sob coerção" na prisão de Bagram, depois de descobrir que o detido passava 24 horas com as mãos e os pés amarrados e, por vezes, de joelhos. As provas obtidas em Guantánamo, porém, foram aceites como válidas. |

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