sábado, 24 de maio de 2008

Vantagens de uma visita presidencial

Há que tirar chapéu à maneira como a visita presidencial à província de Cabo Delgado foi organizada, fora os imprevistos que fizeram com que ela não fosse nos dias atempadamente marcados, do que resultou um enorme fardo para as contas do Estado: regresso à capital do país de alguns ministros (que, como se sabe, viajam na classe executiva) e outros quadros que tinham trabalhos que não se poderiam adiar por mais tempo. Seis helicópteros a facturar, durante quatro dias, sem fazerem nada, mas também a pagarem o estacionamento no aeroporto.
Muitos acompanhantes, entre o pessoal da segurança, de apoio e jornalistas de diferentes Órgãos de Comunicação Social e agências internacionais, parados em Pemba, no que diziam serem “férias bem pagas no Wimbe”, durante quatro dias. Pessoal de avanço já nos distritos escolhidos, muitos meios de transporte mobilizados e com o combustível nos tanques para a viagem adiada por mais quatro dias. Ajudas de custo? Todos os programas feitos para se realizarem logo a seguir à visita presidencial igualmente adiados. A vida normal, digamos, adiada em Cabo Delgado, e não só, por quatro dias.
Dizia, fora este imprevisto, nunca tinha lidado, em 11 anos, com uma visita a esta província, muito bem organizada, em que tudo parecia previsto no programa e as falhas havidas terão sido detectadas, provável e unicamente, por quem estava por detrás da elaboração e execução do programa.
O que é que mudou para que tivéssemos um relatório muito bem estruturado, bem elaborado, apresentado conforme as novas tecnologias recomendam? Não sei. Da última vez o relatório até havia sido fotocopiado em tinta azul.
Macomia, o ponto mais organizado da visita, terá sido o responsável por esta percepção de que toda a jornada esteve bem pensada. É que como diziam algumas pessoas, a experiência manda naquele distrito. Directores de diferentes níveis alimentaram-se no mesmo local com tanta outra gente de outros estratos profissionais e sociais sem ninguém ter murmurado sobre nada, simplesmente porque tudo estava igualmente preparado para quem e como viesse. O velho Xavier Vansela, o administrador, arrecadou muitos pontos, tudo isso junto a um relatório brilhante e que falava de coisas concretas, palpáveis.
A outra vantagem, parece não ser! Acho ser tempo de todos percebermos porque é que as vias de acesso (apenas um exemplo) não são reparadas ou reabilitadas. A resposta de que não há dinheiro para isso caiu em terra nesta visita presidencial. O povo foi informado que há, sim, dinheiro!
Não será por outra razão que em pouco menos de um mês o troço Macomia/Mienguelewa, uma permanente dor de cabeça, de menos de 80 quilómetros e onde se levavam, uma semana antes, três horas de viagem em viaturas em boas condições mecânicas, tenha sido reparado para receber a visita e assim levar-se no mesmo troço menos de uma hora.
Montepuez/Balama: quem diria que fosse possível fazer em menos de uma hora, justamente porque foi reparada a estrada, um dos grandes e permanentes problemas daquela região produtiva? Para Mecufi, uma pista!
Perguntas a fazer, sobre esta vantagem: afinal há dinheiro, ou ele veio “importado” da presidência da República? Afinal há equipamento para a reparação de estradas, em Cabo Delgado, ou fora “importado” de alguma província ou outro país? Afinal há homens capazes de trabalhar noite e dia para fazer um bem comum, ou eles foram “importados” de outro ponto?
Finalmente: não fosse a visita do Presidente da República a Cabo Delgado aonde iriam todos estes recursos usados na reabilitação das vias de acesso que nunca o são para o benefício do povo, que desta vez foi menos importante que uma centena de pessoas em visita à sua província? Outra variante: se o PR tivesse que ficar duas semanas e assim visitar os 16 distritos, não teríamos todas as estradas reabilitadas?
P.S. O ministro Aires Aly disse no Parlamento que nenhum aluno pode ser vedado a assistir aulas por não ter fardamento escolar. César Amade é estudante da Escola Secundária de Pemba, Oitava “D”, está há cinco dias que não assiste aulas, não por falta de uniforme, mas porque ainda não conseguiu dinheiro para colocar o nome da Escola no seu bolso direito. O seu professor, o que sempre manda voltar, chama-se Anacatula.

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